quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

LEONARDO BERTOZZI - UM MINEIRO VIDRADO NA SAPUCAÍ

Minha Outra Paixão - Leonardo Bertozzi

“Essa série tem a intenção de entrevistar jornalistas esportivos, sobre uma paixão não-jornalística e não-esportiva”

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Me senti confortável em telefonar para Leonardo Bertozzi diretamente de minha mesa de trabalho na União das Escolas de Samba Paulistanas. Tudo ao meu redor remete ao carnaval, e isso supriria a ausência da presença (brilhante!) do Editor do Site da Trivela, a mais conceituada revista especializada em futebol internacional da atualidade. Supre, por que a paixão secreta deste mineiro de 28 anos é justamente esse: o carnaval.

Com algumas ponderações. Seu caso de paixão, seu negócio, é com os desfiles cariocas. Da Sapucaí, pra ser mais preciso. Nada de Boi Bumbá, de marchinhas, quase nada de Anhembi. Uma paixão que surgiu através da apuração, tão dramática quanto uma familiar final de campeonato, e uma paixão que, curiosamente, não lhe faz torcer por nenhum pavilhão - diferentemente do futebol italiano, especialidade do jornalista, que afirma torcer por todos os clubes e mais a seleção Azurra.

Bertozzi é mineiro, morou criancinha em Salvador, está em São Paulo desde o fim de 2002, e não vai demorar a aparecer pela segunda vez na Sapucaí, onde só esteve uma vez, no desfile das campeãs de 1996. Lançou o site futebol europeu, passou pelo site oficial do seu clube do coração, o Galo Mineiro, até chegar na Trivela em 2007, na mesma época em que atuou como comentarista da Bandsports e da FX.

O som preferido de Bertozzi é mais pop, menos samba. Mais italiano, menos brasileiro. Engana-se quem acha que só gosta de carnaval quem ama o ritmo do samba. Leonardo sequer sabe sambar - ao menos, na sua maior paixão que é o futebol, ele se sai como um razoável goleiro, segundo ele mesmo.

Bertozzi não parece reclamar do fato de assistir sozinho aos desfiles. "Nenhum amigo meu gosta!". Desde garoto, ele conta, recusava viagens carnavalescas pra curtir, em casa, o evento, sob a narração inesquecível de Fernando Vanucci, Paulo Stein e a programação full time da Manchete. "O carnaval alternativo, de bailes, essas coisas, já não gostava", pondera um dos expoentes atuais do jornalismo esportivo que cuida com açúcar e afeto das pautas alternativas.

Porém, parece que vem aí uma companheira em potencial. Laura, sua filha, está pra nascer, justo na época do carnaval. É a primeira cria de Bertozzi, casado com Priscila, também jornalista, do site Máquina do Esporte.

O sotaque mineiro é indisfarçável, mesmo por telefone. E o carinho de Leonardo pela obra que brota do cimento da Sapucaí também salta aos olhos. Sua memória para anos, desfiles e momentos é, assim como para assuntos futebolísticos, potente. Em uma dúzia de perguntas, aí está o que Bertozzi sente e pensa do Carnaval.

Como você conheceu o carnaval e como vocês se aproximaram?

Cara, foi como muita gente, acredito. Eu comecei a acompanhar o carnaval do Rio de Janeiro a partir da apuração. Era criança e passava o carnaval com a família. Na 4ª feira eu achava um barato aquela coisa da apuração, as notas 10, os caras brigando... um barato, e foi minha primeira relação com a festa.

E o contato com os desfiles veio em seguida...

Sim, nos anos seguintes me interessei também em ver os desfiles, a organização toda. O primeiro desfile que eu me lembro de ter visto bem claramente foi o de 1989, da Imperatriz. A partir daí eu me amarrei cada vez mais. Tentava virar a noite, nem sempre conseguia, mas depois via o compacto à tarde. Depois vinha a apuração, o desfile das campeãs... Em 96 eu tive a chance de ver ao vivo as campeãs. Eu tinha 15 anos, foi inesquecível.

Mineiro, longe da sapucaí, você pulava o carnaval aonde?

Isso tudo, de começar a assistir, foi morando em Belo Horizonte. Morei em BH até me formar na faculdade, só que no carnaval eu viajava com a família pra Araxá, no interior de minas, e lá tinha muita festa de carnaval. Só eu preferia assistir aos desfiles, ao invés de sair.

Se você começou a ver o carnaval a partir da apuração, então podemos traçar um paralelo com o futebol. Sua relação com o carnaval é mais pela competição do que pela arte?

Certamente. Acho o espetáculo belo, a coisa de representar a cultura brasileira. Mas o que eu curto mesmo é a competição. Nos anos 90, me lembro, tinha até uma polemica sobre a Imperatriz, que ganhou seguidamente e falavam que era uma "escola chata"... Mas pô, eles estão lá pra competir, vão fazer o negócio pra ganhar! Pra mim sempre foi claro que o carnaval era um grande campeonato.

E a parte estética? Se sobrepõe ao conteúdo?

Olha, gosto de aprender com um desfile. Não chego a assistir um desfile com papelzinho na mão, anotando ou lendo, mas gosto. A parte estética, ainda mais com o advento, nos anos 90, desses carros mais tecnológicos, está em alta. E também tem outra: ninguém vai gostar de uma escola que se apresente feia, por mais que o enredo seja bom. Têm atualmente o ingrediente das rainhas da bateria, essas celebridades que dão destaque também à estética.

Existem outras comparações possíveis entre carnaval e futebol?

No RJ a paixão de clube e de escola é semelhante. Lá é normal o cara ser Flamengo e Mangueira. Aqui em SP, nem tanto, é incomum o cara falar que é Vai-Vai e Corinthians. Só em casos como a Gaviões da Fiel, que é ligada diretamente ao futebol. O envolvimento que o carioca tem é muito forte, e essa ligação é muito parecida com a ligação que a gente tem com o futebol.

Atrações semelhantes, como Boi-Bumbá, te atraem também?

Sinceramente, não. Desconhecimento meu? Talvez. Mas nunca me interessei por me aprofundar. O carnaval me fazia preferir ficar em casa na boa a viajar, na adolescência.

Você frequenta, compra, participa, acompanha de perto algum aspecto de alguma escola?

Não sou consumidor ou frequentador. Quando fui em 96, achei muito legal, inclusive porque o desfile das campeãs é mais leve, mais divertido, e é legal se aproximar das escolas. Mas acompanho à distância, não sou um consumidor oficial.

Seus desfiles prediletos, viu na TV ou ao vivo?

Os que vi ao vivo foram belos mas não foram os que mais me marcaram. Gosto de lembrar o de 1993 do Salgueiro, espetacular. A Estácio de Sá em 92, que ganhou da Mocidade... Dois sambas que mataram a pau. A gente fica mais crítico com o tempo, então os mais inesquecíveis pra mim são alguns de quando eu era mais novo. Mas tem o exemplo do samba do Chico Buarque na Mangueira, em 98, que foi sensacional também.

O normal hoje entre as torcidas de futebol do Brasil é cantar músicas de origem latinas. Porque o carnaval perdeu espaço nas bancadas?

São duas coisas: tem o lado da perda da identidade, sim, mas também é uma fase pobre em termos de samba. Você não vê mais sambas propícios, como Ole-lê Ola-lá (Pega no ganzê / pega no ganzá), que toda torcida canta, é mais adaptável, com melodia mais fácil, ou mesmo o Explode Coração (na maior felicidade...). Acho que a penetração das músicas latinas é um fato sim, mas também por culpa da falta de um samba forte, que faz o povo o levar aos estádios.

Fundemos a escola Acadêmicos do Bertozzi. Qual seria seu enredo pra 2009?

Meu enredo seria a história das Copas do Mundo, temperada pelos títulos do Brasil. Já fizeram enredo de alguns times, e esse seria rico, pegaria momentos históricos muito fortes, com varias épocas diferentes do Brasil, de 1958 a 2002... Espero que alguém ainda o faça.

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