sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Luiz Fernando Bindi

Hoje Luiz Fernando Bindi faria 36 anos de vida. Morreu no dia 22 de julho.

Se você não conheceu o trabalho do Bindi, foi por falta de tempo. Certamente você o conheceria daqui, sei lá, um, dois anos. Se você conheceu seu trabalho, sabe o tamanho da destreza e categoria.

Eu conheci o trabalho e a pessoa. Fui um privilegiado. Quando ele partiu, este blog não existia. Este blog, inclusive, é dedicado a ele. E, abaixo, o que eu escrevi, no dia 23, certamente o texto mais difícl que já escrevi.

Feliz aniversário, Bindão.

* * * * *

Nessum Dorma

Chego em casa quase meia-noite. Minha mãe me recepciona e eu lhe presenteio com um aparelho de MP3 que ganhara horas antes. Ela agradece mas não entende muito. Explico didaticamente a finalidade do bichinho. Ela comemora e pergunta se pode ouvir qualquer música. Digo que ponho o que ela pedir. Ela cita uma música. Eu pasmo. pergunto porque justo aquela.

-Essa música a Vandinha pediu pra eu ouvir no dia que ela morreu, quando a gente era menina.

Eu engulo seco. Tento lhe contar uma má notícia, mas opto por uma frase mais simples.

-Mãe... a gente se acostuma com essa coisa de morte?
-Ah, filho... não tem jeito, sempre dói. A gente não aprende.

Eu tomo o MP3 de sua mão e vou para o quarto, chorar e escrever estas linhas. A música que ela citou era exatamente a mesma que estava ouvindo, horas antes, fim de tarde, na mesa de trabalho, quando recebi a notícia que me congelou a espinha.

Estava vendo o blog do meu amigo, o jornalista e geógrafo Luiz Fernando Bindi. Uma postagem nova tinha uma foto curiosa, que mostrei ao parceiro de sala, e depois enviei, por link, para alguns amigos online. Um deles me respondeu.

-Legal a foto, mas você me enviou pela foto ou pela morte?

E foi assim que soube que Bindi partiu. Estava na sala de seu blog, no quintal de sua postagem, avisando os vizinhos para que olhassem aquele quintal. Tão vivo. A música se seguiu enquanto eu chorava e tinha que receber na porta o tal amigo que me daria o MP3.

Não consigo levantar da cadeira. "Digam que não estou". Tento notícias. E é fato que o coração amável do gordinho mais batuta da Mooca parou de bater. Falo com meu amigo Kadj Oman, para dizer a ele que sou feliz em te-lo conhecido este ano. Algo que queria ter dito a Bindi, a melhor pessoa que conheci nos últimos tempos.

A última vez que falei com ele foi via SMS, como sempre fazíamos após os jogos do Palmeiras. abro a mensagem e não soa como vindo de um falecido. Falo com uma colega da rádio 105FM. Vão pipocando mensagens pela internet toda. Perplexas. Tetricamente, recados choviam no orkut do nosso Bindi.

Que me chamava de "Foca de Base", desde que montamos uma metáfora futebolística para os estágios de nossa carreira, que, inclusive, ele vinha tão feliz em construir. Que eu chamava de "novo Claudio Zaidan", posto que costumávamos ter os mesmos ídolos. Que nunca me poupou, nunca foi paternalista, e isso só valorizou cada elogio que fez aos meus atributos profissionais. Que já me deu conselhos amorosos, morais, me deu dicas de mercado e cinema, e sempre foi absolutamente generoso ao passar seus conhecimentos, dividir suas informações, ensinar seus métodos, a quem quer que fosse, e a mim também. Ele sabia que o único capital intangível está naquilo que fica quando a gente se vai.

Falávamos muito sobre ópera. Tínhamos cachorros da mesma raça, e o amor dele pelos bichos era divino. Eu tinha prazer em ter no Bindi um lugar pra aprender de pouco em pouco, um nome que eu podia ter como referência, porque ele era um profissional obcecado por lisura e conduta linear, e uma pessoa de inesgotável doçura. Um cara e tanto. Só 35 anos. Um dos maiores arcabouços culturais desse país não pode mais ser acessado.

Eu não queria só agradecer a força que ele sempre me deu desde que viu meu trabalho. Eu queria tocar minha carreira com ele por perto. Sabe lá o que será do meu futuro. Mas eu queria ver o que seria do promissor futuro dele. Não verei.

É normal que, quando alguém morre, surgam relatos hiperbolizando a bondade do sujeito. Aos olhos de quem não o conheceu, Luiz Fernando Bindi é uma dessas vítimas. Pois ele era uma espécie de unanimidade em seu universo. Sábio e confiável à primeira vista. Um dos mais talentosos pesquisadores desse país. Um cara que, por mais torpe que soe, não podia nem merecia morrer tão cedo, e tão antes de tanta gente. Insubstituível.

Dói e a questão não é se acostumar. É certo que vai ficar um pigarro, um arranhão na garganta. Esta falta vai incomodar a cada um de nós. Por mais que daqui pra frente tudo aconteça de bom, haverá a ressalva: "Mas seria melhor se o Bindi estivesse por aqui". O moço tão simples e de tão absurda capacidade, que eu conheci a tão pouco tempo e já tenho que me despedir. E fui.

-Você era amigo do trabalho dele?

-Não. Eu era aluno.

3 comentários:

Anônimo disse...

Bom, sempre aparecem em nossas vidas pessoas especiais que parecem sempre nos ensinar os caminhos a serem seguidos. E, infelizmente, do mesmo jeito que elas vem, elas acabam indo embora. E é sempre duro ter que lhe dar com essa coisa de morrer. Talvez no final das contas sirva como um apoio para seguir um caminho que você ainda não tinha enchergado. Gosto sempre de imaginar que quando alguém vai embora pode ser que tenha acontecido algo com ela pra que o bem fosse feito ao próximo ou aquele que mais precisa. Uma coisa para o bem, mas que é difícil ver se foi para o bem ou não.

O tempo é que vai nos ensinar e mostrar, o que foi bom e o por que de tanta dor.

Um simples comentário para uma bela homenagem como essa que você fez a um grande amigo. Eu também perdi um amigo esse ano. Amigo de infância, daqueles que jogavam aqui no quintal da minha casa quase todos os dias da semana. Doeu demais. Mas a gente vai aprendendo a conviver né.

Me sinto tranquilo em ler suas postagens. Admiro a sua serenidade e o modo como você escreve. Acho que estou um pouco cansado, assim como você, daquele dia-a-dia do futebol, do turbilhão de informações, fofocas, disputas irracionais e etc. Visito seu blog todos os dias procurando um conforto e fico tranquilo em saber que existe mais uma pessoa que vê o futebol e tem uma visão geral de tudo, parecida com o meu modo de enxergar as coisas.

Mais razão e menos emoção, é isso que falta pra muita gente. Até mesmo na hora de se despedir de um ente querido é preciso agir racionalmente.

Bom, já falei demais.

Abraço Leandro!

Anônimo disse...

Emocionante! Um dia, no céu, você vai apresentar ele pra mim...

Abraços,

Rafael
(Rumo ao Hepta!!!!!!!)

Leandro Iamin disse...

Enaldo, gradeço emocionado suas palavras. De verdade. Meu blog já cumpre seu objetivo.