quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Sobre Leões
















Não adiantaria dizer ao torcedor da Portuguesa que é assim mesmo, que há uma nova realidade no futebol brasileiro, e nessa realidade planejamento, profissionalismo e estrutura são mais do que meros termos retóricos e vazios.

Tampouco ganharei a simpatia do lusitano se avaliar a Portuguesa como acima dessa mentalidade perfeitinha do futebol atual. A Lusa é errante, é tranco-e-barrancosa, isso é nobre, mas "e daí?", vai me responder o rubro-verde.

Às vezes noto que o rubro-verde não se importa nem com argumentos prós, muito menos com contras. Ele é à prova de argumentos.

Hoje são só 20 times na Elite, então é difícil se manter. "E o Barueri pode ser um desses?" Ora, o Barueri montou uma estrutura compromissada com políticos, e já faz alguns anos. "Mas doze anos atrás a Portuguesa foi finalista do Brasileirão!".

O fato é que não dá para consolar um lusitano. Não tem caminho. Esse time tem uma pinta única, vai na contra-mão da cultura brasileira que reza que "quanto menos torcida, mais vergonha você deve ter de seu próprio time". A Portuguesa é colônia. É cheia de piadas prontas, de cagadas, de mesquinharias. E é incapaz de causar antipatia nacional.

Mas o torcedor da Lusa muito menos vai ficar satisfeito se eu disser que vou às vezes ao Canindé, e que são muitos os não-lusitanos que torcem "um pouquinho" pelo time. Eu mesmo, torço. E não é porque os acho menores, inofensivos, café-com-leite. Na verdade, eu não sei porquê. O Canindé me relaxa, a Portuguesa representa bem o futebol que eu amo, mística e à flor da pele.

Esse torcedor da Lusa é engraçado. É mesmo um leão. Eu sempre os comparei a um siri. Valente como é, se o siri tivesse o tamanho de um tubarão, não haveria baleia para tirar farinha com ele. E nessa cidade que sufoca tudo que não é "maior", existir a Lusa, na Marginal e à margem das grandes manchetes, beira o inacreditável.

Eu tenho e tive amigos portugueses. Um faleceu, outro vive nas bancadas, outro até foi da assessoria de imprensa. Tive um primo que jogou lá, nos juniores, e ele ficou 14 meses sem receber salário. Não tenho raiva. Entendo a Lusa. Entendo o futebol brasileiro. Entendo que alguns cartolas que passaram pelo Canindé nunca souberam interpretar esse time, e o rubro-verde há de pagar por isso por mais alguns anos.

Eles estão outra vez na Segunda Divisão. Por mais previsível que fosse, é triste dialogar com meu amigo. No primeiro minuto, me senti constrangido, penalizado, horrorizado com o tom de sua voz, com a dor que ele estava sentindo.

Mas no segundo minuto, assim, naturalmente, a coisa se inverteu. Entendi porque não há nenhuma maneira de tentar consolar um torcedor da Portuguesa: apenas não é preciso.

Era mais fácil ele me convencer que ir pra Série-B é uma boa do que eu convencê-lo de qualquer coisa. Inclusive, eu saí do papo convencido que, se a Lusinha vai fazer falta na A, por outro lado nem vai doer estar na B, preencher a B, valorizar a B, que a cada ano está mais forte. A Portuguesa já passou, terna, por coisa muito pior. O torcedor canindeísta há de se sacrificar de novo, e não vai reclamar com deus nem jogar isso na cara das "grandes torcidas" do país. Estas que se acham as fodonas da Rua de Cima só porque estão em maior número.

Faz parte da via-crucis do português. Toda massa sofre suas tragédias. Nenhuma reage à elas igual o lusitano. No fundo, eles gostam do estrago.

Não há nada mais forte que um peito rubro-verde.

10 comentários:

Anônimo disse...

Excelente!
Também sempre gostei da Lusa...

Abraços,

Rafael
(sem pressa, rumo ao Hexa !!!!!!)

Elcio Mendonça disse...

Leandro, parabéns pelo brilhante texto.

Você uma análise perfeita sobre a Lusa e me fez até pensar em coisas que não passavam pela minha cabeça.

Não sei se é o fato de se tratar do terceiro rebaixamento em seis anos, ou o amadurecimento de estar trabalhando com futebol, mas quer saber? Caímos? Vamos jogar e subir de novo.

Não vejo a Série B como um desastre.É claro que prejudica o clube, uma vez que estávamos nos reestruturando, mas vamos subir de novo.

Depois desse texto, sou palmeirense desde criancinha no domingo... hehehe

Abraços

Anônimo disse...

Fico encantado com seus textos, tem um vigor sentimental impressionante. Creio que você deve ser ainda mais realizado por isso. Minhas sinceras homenagens. Alysson Honorato.

Anônimo disse...

Não sei de Valores, mas a queda de desempenho da lusa dá pra ser facilmente explicada.

Do time de 96, rodrigo fabri foi vendido pro Real Madrid. cade o dinheiro da venda dele ?? o mesmo posso perguntar sobre o dinheiro da transação de Zé Roberto, Zé Maria, Leandro Amaral, Émerson, César etc... Todos vendidos pra europa. e não foram vendidos baratos.

No que esse dinheiro foi investido ?? muitos torcedores criticam a atual administração do dalupa, mas ele teve o azar da bomba explodir no colo dele.

fico muito puto de ver meu time com mais de 88 anos de história perdendo espaço para barueris e ipatingas da vida... mas é a nova ordem do futebol. quem não se cuidar vai cair mesmo...

Anônimo disse...

A Portuguesa é a antítese do São Paulo???

Leandro Iamin disse...

Paulo Lopes, que veneno! Hehe. De fato, são times de postura muito distintas. Se são antagônicas, é outra questão.

Fernando disse...

Gostar da Lusa é fácil... Torcer para a Lusa não é tarefa para qualquer um. E eu não sou qualquer um! Parabéns pelo texto.

Anônimo disse...

Cada dia que passa eu também me decepciono com essa mentalidade do torcedor brasileiro de que menos torcida é mais vergonha. Sou aqui do Rio Grande do Norte, de uma cidadezinha chamada Mossoró. A Mossoró do Baraúnas, do Márcio Mossoró, do Nonato (ex-jogador do cruzeiro e hoje dirigente do mesmo), a Mossoró do Sal e do Petróleo. E fico eu mais surpreso ainda, pois como torcedor do Baraúnas já vejo dirigentes do meu clube do coração com a mentalidade igual a de outros clubes 'Grandes' do nosso futebol. Eu sempre tive uma queda pelo São Paulo, vivi intensamente as libertadores e os mundiais de 92 e 93, mas tenho como esse exemplo o próprio clube que admiro. Uma política de querer que a torcida seja do São Paulo consiga bater, um dia, a torcida de flamengo e corinthians. Lamentável.

Fico mais triste ainda, quando vejo torcedores desiludidos com aqueles torcedores que a globo mostra. Com a festa que as 'torcidas' fazem. Mas como sabemos Leandro, torcida não ganha jogo.

Mas é essa a grande saída para torcedores de Corinthians e Flamengo e tantos outros. Não quero desmerecer nenhum dos times, mas chega a ser decepcionante ver que hoje o torcedor esquece o futebol, esquece a estrutura, o planejamento, pra pensar na torcida. Torcer é fundamental, mas hoje é evidente que precisamos deixar a emoção um pouco de lado e aliar-se a razão.

Já fui apaixonado demais por futebol e confesso que ainda hoje tenho uma certa paixão reprimida. Mas eu aprendi a torcer. Aprendi que não adianta chorar, gritar, fazer loucuras por um time de futebo. Hoje eu torço comigo mesmo. Vibro nas vitórias e não fico nenhum pouco preocupado nas derrotas.

Assim como o torcedor Lusitano eu valorizo as minhas raízes. E eu aqui no meu interior do nordeste brasileiro tenho que valorizar o que é da minha terra e cobrar um tanto mais a cada dia de quem dirige o meu clube. O clube que eu cresci vendo jogos no Estádio Municipal da minha cida. O meu time que eliminou o Vasco da Gama em 2005 da Copa do Brasil em pleno São Januário. Com um gol de Cícero Ramalho, atacante que na época tinha 42 anos. Esse é que eu valorizo e vai ser esse que vou levar pra sempre no coração. Na alma de torcedor. Independente de tamanho de torcida ou títulos conquistados.

Coinscidentemente o mascote do Baraúnas é um Leão, e aposto que a alma do torcedor do Baraúnas é coisa parecida em partes com o do torcedor da Lusa.

Um abraço.

Leandro Iamin disse...

É isso aí, Enaldo. Falta essa cultura para nós, torcedores brasileiros, de nos considerarmos de fato parte da explicação dessa coisa que é o futebol. Somos míopes em relação ao papel do torcedor, ao fato de sermos uma classe, uma história a se contar. abraço!

Unknown disse...

A questão não é só de vergonha do próprio time, muito pelo contrário!
Quem torce para a Lusa, não tem vergonha de seu time e de suas raízes.
Afinal, se todos os portugueses e descendentes de portugueses em SP torcessem para a Lusa, com certeza ela teria uma das maoires torcidas de SP.
Vergonha quem tem são estes descendentes que não escolheram a Lusa e que a maioria das vezes tem vergonha de dizer até que é descendente de portugueses.
Mas, infelizmente, nós já estamos acostumados com isso.